sábado, 12 de janeiro de 2013

BALADA DE NEVE

Outro poeta português que julgo não ser muito conhecido internacionalmente é AUGUSTO GIL,natural do Porto.
A sua poesia,segundo Esther Lemos,caracterizava-se por uma atmosfera sentimental,mista de complacente e serena bondade.
Para mim,esta balada é de um encanto raro.

Batem leve,levemente
como quem chama por mim
Será chuva?Será gente?
Gente não é,certamente
e a chuva não bate assim.

É talvez a ventania:
mas há pouco,há poucochinho,
nem uma agulha bulia
na quieta melancolia
dos pinheiros do caminho...

Quem bate assim,levemente,
com tão estranha leveza,
que mal se ouve,mal se sente
Não é chuva,nem é gente,
nem é vento com certeza.

Fui ver.A neve caía
do azul cinzento do céu,
branca e leve,branca e fria...
-Há quanto tempo a não via!
E que saudades,Deus meu!

Olho-a através da vidraça.
Pôs tudo da cor do linho.
passa gente e, quando passa,
os passos imprime e traça
na brancura do caminho...

Fico olhando esses sinais
da pobre gente que avança,
e noto,por entre os mais,
os traços miniaturais
duns pezitos de criança...

E descalcinhos,doridos...
a neve deixa inda vê-los,
primeiro bem definidos,
depois,em sulcos compridos,
porque não podia erguê-los!...

Que quem já é pecador
sofra tormentos,enfim!
Mas as crianças,Senhor,
porque lhes dais tanta dor?!...
Porque padecem assim?!...

E uma infinita tristeza
uma funda turbação
entra em mim,fica em mim presa.
Cai neve na Natureza
-e cai no meu coração.


AUGUSTO GIL,in Luar de janeiro

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